Você que me dá o prazer de acompanhar o “A Arte Do Meu Povo” deve está estranhando a demora na atualização,e aí eu peço desculpas, é que nos últimos tempos estou tendo um pouco de dificuldade para entrar na Net.Mas pode ficar tranquilo ou tranquila porque as atualizações irão continuar sim.
A nossa cultura popular tem que ser divulgada, as pessoas que lutaram e fizeram e as que lutam e fazem coisa boa do e para o Brasil devem ser homenageadas e é isso que eu faço aqui e continuarei fazendo sempre para os apaixonados, como eu, pela brasilidade, brasileira do Brasil.
Hoje o homenageado é um grande poeta da nossa cultura popular, que esteve entre nós no século passado, José Bento de Oliveira (o Nhô Bento).
Infelismente nas minhas pesquisas pela internet encontrei pouca coisa sobre esse grande brasileiro, mesmo assim no Blog http://toquemusical.files.wordpress.com/2010/04/catulo-e-nho-bento- encontrei a seguinte citação:
“Nhô Bento, José Bento de Oliveira, é outra figura que não fica muito atrás. Um poeta popular, um tanto o quanto esquecido. Nasceu no litoral paulista no início do século XX. Mudou-se para a capital ainda jovem, tornando-se poeta de linguagem cabocla. Sua poesia reflete a figura do caipira. É ainda mais brejeiro, caboclo e matuto. Pelo que eu sei, ele escreveu apenas um livro, “Rosário de Capiá” em 1946, reunindo 58 de suas poesias (o prefácio era de Monteiro Lobato).”
Já no site www.artcanal.com.br/.../plaquetas.htm encontrei o seguinte:
“Nhô Bento é José Bento de Oliveira, autodidata e repentista nascido em São Sebastião, SP, em 1902, e falecido em São Paulo, capital, em 1968.”
Mesmo com a dificuldade,já citada, conseguí pescar em uma visita ao site da Tv Cultura de São Paulo, o www2.tvcultura.com.br/srbrasil/poemas , dois poemas do enorme Nhô Bento, pra gente se deliciar com um pouco da sua imensa genialidade.
Titulo: A cascavé
Autor: José Bento de Oliveira (Nhô Bento)
TUDA VEIZ QUE ELE IA NA ESTAÇÃO
E ARRECEBIA CRTA DO BASTIÃO
VINHA MI PERCURA TÃO SASTIFEITO
QUE O POBRE DO VEÍNHO
INTÉ GARRAVA UM JEITO DE MOÇO
QUE NÃO TEM BARBA NA CARA
CORRENDO ELE VARAVA A CERCA DE TAQUARA
E CHEGAVA SE RINDO ME PEDINDO PREU LÊ A CARTA QUE O FILHO ESCREVEU
MAIS DE OITO ANO SEM PARÁ FOI EU QUE LEU AS CARTA DELE
UMA POR UMA E VIA AS TRISTEZA E AS ALEGRIA QUE O VÉIO TINHA
COM AS NOTICIA QUE VINHA
LIA PRA ELE ESCUITÁ DISPOIS NHÔ GABRRIÉ PEDIA PREU GUARDÁ
VO LÊ PRA MICEIS ESTA AQUI QUE É A PRIMEIRA
O VÉIO INTÉ CHORÔ CUM A BRINCADERA
QUAL É O PAI QUE QUÉ VÊ O FILHO JUDIADO NÉ?
OLHA SÓ QUE O DESESPERADO E POBRE DO RAPAIS MANDÔ DIZÊ
-NHÔ PAI NUM POSSO MAIS SUPORTÁ OS DESAFORO DO PATRÃO
SÓ ME CHAMA DE TONTO E CAIPIRÃO
A PESTE DA PATROA QUE PARECIA SÊ BOA PESSOA
GARRÔ A ME CHAMÁ DE INDIGE
E DIZ QUE MEU LUGÁ É A MATA VIRGE-
TUDO ESSAS CARTA QUE MECÊS TÃO VENDO
FOI CHEGANDO EU FUI LENDO
EU IA LENDO ELE IA ESCUITANDO
E AS CARTA QUE DISPOIS DE UM ANO O VÉIO ME PEDIA PRA MIM LÊ
INTÉ DA GOSTO DE VÊ
É ESCRIVIDA COM LETRA DE JORNÁ
PRÁ LÊ NUM É PRICISO INGARUPÁ OS ÓCRU NU NARIZ
TEM CADA UMA COM CADA PALAVRIADO
QUE DEXAVA NÓIS DOIS ATRAPAIADO
ÓIA SÓ O QUE ESSA AQUI DIZ
-A MINHA VIDA É A SAMBRIA FLORESTA QUE O SÓ DO AMÔ MUDA NUMA SALA DE FESTA
NHÔ PAI VÔ ME CASÁ QUEBREI O CUMPRUMISSO DE FICÁ CELIBATARO-
ÓI SÓ C E L I B A T A R O OCEIS SABE O QUE É?
SI NUM FOSSE O BUTICARIO NÓIS DOIS FICAVA SEM SABÊ
É QUEM FICA SORTERO INTÉ MORRÊ
BÃO,CUM ESSA NOTICIA O VEINHO INTÉ CANTÔ
INTÉ UMA BEBEDERA ELE TOMÔ
CONTO PRÁ TUDO POVO COMPRO UM SAPATÃO NOVO
UM PAREIO DE ROPA NO SALIN
NUNCA VIMO ELE TÃO CUNTENTE ANSSIM
ESCUITE AGORA A URTIMA RICIBIDA QUE ERA MIÓ QUE FOSSE CONSUMIDA
-ACHO BÃO O SINHÔ NUM VIM NO CASAMENTO
O POVO DAQUI É LUXENTO
DEVE DE CUMPARECÊ PESSOA DE ARTA RODA
QUE SE TRAJA DE ACORDO COM A MODA
PUR ISSO NUM DESEJO QUE A SUA ABSOLUTA FARTA DE TRAQUEJO
ME DEXE IMBREGONHADO JOSTAMENTE NO DIA DO NOIVADO-
QUANDO EU CABEI DE LÊ ELE GARRÔ A TREMÊ,TREMÊ FICO BRANCO,BRANCO
SE ASSENTÔ SALUÇANDO ALÍ NO BANCO
BEBEU ÀGUA E FOI SE EMBORA SE ARRASTANDO
DA JENELA INDA PUDE VÊ ELE TRAVESSANDO LA A PONTE DO CÓRGUINHO
NO OUTRO DIA BEM CEDINHO
PERTO DUM PAU DALHO ALÍ NO ATALHO
ACHARO O POBRE ESTICADO
LOGO CHEGÔ O SUBODELEGADO COM DOIS SORDADO JUNTO
TUVERAM VENDO ALÍ O CORPO DO DIFUNTO E ARGUEM DISSE
DEVE DE TE SIDO ARGUMA CASCAVÉ QUE MORDEU NHÔ GABRIÉ.
Titulo: O Lubisômi
Autor: Nhô Bento
Fiquemo um tempão ali se namorando
Eu oiando bem nele, ele me oiando
Rezei um oração, num diantô...
Fiz o pelo siná, ele afastô,
Mas eu errei, num fiz co a mão direita
E o coisa ruim vortô.
Mas aí eu fiquei com mais corage
Me deu réiva, eu num corro da bobage...
ranquei da cinta minha garrucha
E gritei: Ocê imbucha ou desimbucha ?
Engatiei, puchei. Quá tiro nada.
A garrucha intupiu...No desespero
Eu tremia quiném um maleitero
Pru que o Lúcifer ficou valente
Que nem leão...e estralava os dente
Mais brabo inté do que quarqué quexada(faz)
Eu dava pulo assim, deste tamanho
Pra me livra dos dente do Diánho...
Uma hora que ele quis me atarracá
Minha potranca azulô no matagá
E me dexô sozinho com o ladrão.
Gramei cô tá um pedacinho duro...
Inté que eu gritei pra ele: Te escunjuro...
Seja quem for suma pros Quinto já..
Aí ele murchô, garrô a uivá
Triste que retaiáva o coração.
Quando parou de uiva...dava dó vê..
Ele oiô pra eu, cumo quem diz: Ocê..
Pruquê me escunjurô ? Minha sorte é esta..
Coitado. Eu sei que escunjurá num presta..
Mas só fazendo ansim ficava em paz..
Deus que me perdoe se escunjurando errei..
Mas afiná num fui eu que provoquei.
Despois ele me oiô muito sentido
Cumo argúem quando fica arrependido...
Entrou dentro do mato e eu num vi ele mais.
Bão.. eu vim vindo a pé...
vinha pensando o causo que passô
quando ascancei o sitio do Dotô
topei com meu cumpade Zé Correia...
Contei o causo pra ele, contei tudo...
Ele escuitava e ta..mas tava mudo,
Maginando decerto que eu mentia..
Eu que num minto e sei o que dizia
Fui ficando com as purga atrás da orêia
Inté que eu catuquei:--Cumé mecê duvida ?
Ele me disse: É, pode ser..
Pode ser não ora essa...pois eu vi.
Eu que tava queimado, ai xinguei
a assombração de tudos nome.
Quando oiêi pro cumpade ele chorava..
Dava dó vê como saluçava.
Aí é que eu percebi. Quá..essa vida
Há de ter sempre história assim doida.
história que consomi..
Era ele, o cumpade Zé Correia...o LOBISOMI.
"E VIVA A ARTE DO MEU POVO!!!"
Encontrei-me recentemente com esta obra,Nhô Bento é sui generis, o livro está aqui ao lado, estou lendo com muito cuidado e respeito. É lindo. Parabéns pelo blog, convido-o a conhecer o meu http://misteriosdovale.blogspot.com , aguardo sua visita e temos muitas histórias para trocar e divulgar.
ResponderExcluirPaz e bem!
Sônia Gabriel
Quando comecei a ler as poesias do Nhô Bento fiquei curioso. Adorei, meu pai, curiosamente, era também um Nhô Bento da região de Biritiba Mirim, Salesópolis, Guararema e Mogi das Cruzes. Foi Expedicionário e voltou vivo. Vivo e lúcido meu querido papai caipira de quem tanto orgulho eu tive e tenho. Nosso linguajar nos sertões de Biritiba Mirim e Salesópolis, era esse aí, da poesia. A que saudade... me remeti a 50 anos atrás... se diplomas hoje eu tenho, é graças ao meu querido e inesquecível pai ... Nhô Bento!!! Obrigado poeta Nhô Bento, você fez-me lembrar do meu pai, seu Xará Nhô Bento ... Deus lhe recompense no mundo que você estiver. Obrigado !
ResponderExcluirParabéns pelo belo trabalho
ResponderExcluirTranscrevi a que está abaixo:
ResponderExcluir[[Catullo da Paixão Cearense e Nhô Bento]]
Pra mim quarqué coisinha dá
Quarqué coisinha me contenta
Pra mim quarqué coisinha dá
Porque o meu corpo se assustenta
sem comer muito inté invará
Quarqué bobagem chega e sobra
pro meu armoço, janta e ceia
um feijãozinho com abóbra
lábios de porco, pé e oreia
Cove mineira, cumbuquira,
lambari frito, taraíra,
suão de porco com arroz
Tudo isso eu penso todo dia
quando a barriga tá vazia
pra nós comer juntinho os dois
Um anguzinho bem de gato
ou então um cardo arreforçado
de uma serraia no feijão
É que eu to sempre imaginando
pra nós comer, se lambuzando
cara, nariz, o zóio, as mão
Quarqué coisinha me contenta
Pra mim quarqué coisinha dá
A minha fome quando esquenta
num qué se enxer até estourar
Um torresminho pururuca que a gente masca
e não machuca o céu da boca no comer
Ou então um lombo tostadinho
com uma farofa e arroz sortinho
só pra nós dois, eu e mecê
Um tinto bom, feito em rodela,
bem temperado na panela
Uma cadorna, uma perdiz,
É o que eu magino quando armoço
Pra miorá o prato nosso
pra nós devera ser feliz
Frango ensopado com parmito
uns tanquinho grande, bem frito,
douradinho com pirão.
Ou, em farta disso, uma leitoa,
que a gente agruda e não perdoa
de lambuzar devera as mão.
Um cuzcuzinho fumegante
que deixa a gente até fungando
que nem cachorro de mal faz
Vaca bem gorda, tatu bola
Que quando eu como o peito empolga
Que quem me vê bota reparo
Quarqué coisinha me cuntenta,
pra mim quarqué coisinha dá
Porque o meu corpo se assustenta
sem comer muito inté invará
Magina só que bão que era
Nós dois catando na tiguera
um caruru desses miudinho
pra nós comer essa gostosura
bem passadinho na gordura
com a língua inté dando estralinho
E o galo véio bem cozido?
Que fica tão amolecido
que se derrete inté na boca
Rolinha assada no espeto
que a gente óia feio: é preto
mas pra comer é uma coisa louca
Ou então linguiça no brazeiro
que espaia e sorta pro terreio
o cheiro bão que assanha a gente
e a cuia cheia inté a beirada
de uma farinha bem torrada
inté chiando ainda de quente
E a guaiavada de pelota?
Que a gente atara um naco
e bota na boca e a língua pra comer
rige nos dente, esfrega, espreme
canta, saluça, chora e geme
porque é gostosa como o quê.
E eu e mecê rindo na mesa
só imaginando boniteza
comendo só o que há de mais bão
Despois oiá pro céu, pro ataio,
e pra roseira arcando os gaio
ansim de rosa e de botão
Quarqué coisinha me assustenta
sonho com minhas coisa até impachar
mecê sozinha me acontenta
Pra mim quarqué coisinha dá!